segunda-feira, 18 de maio de 2009

Negra

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Gentes estranhas com seus olhos cheios doutros mundos
Quiseram cantar teus encantos
Para elas só de mistérios profundos,
De delírios e feitiçarias…
Teus encantos profundos de África.
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Mas não puderam.
Em seus formais e rendilhados cantos,
Ausentes de emoção e sinceridade,
Quedas-te longínqua, inatingível,
Virgem de contactos mais fundos.
E te mascaram de esfinge de ébano, amante sensual,
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Jarra etrusca, exotismo tropical,
Demência, atracção, crueldade,
Animalidade, magia…
E não sabemos quantas outras palavras vistosas e vazias.
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Em seus formais cantos rendilhados
Foste tudo, negra…
Menos tu.
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E ainda bem.
Ainda bem que nos deixaram a nós,
Do mesmo sangue, mesmos nervos, carne, alma,
Sofrimento,
A glória única e sentida de te cantar
Com emoção verdadeira e radical,
A glória comovida de te cantar, toda amassada,
Moldada, vazada nesta sílaba imensa e luminosa: MÃE.


Noémia de Sousa
(Moçambique)

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